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Arthur Melo fala sobre seu quarto disco, Mirantes Emocionais

Foto: Artur Souza


Arthur Melo é um multi-instrumentista mineiro que vem, desde 2017, tornando-se referência no vasto mercado musical brasileiro. Seu trabalho é associado a uma nova geração de cantautores locais que, gradativamente, tem conquistado corações e mentes de entusiastas da boa música.


Com quatro álbuns lançados, Melo tem como força motriz de seu trabalho uma sonoridade pautada por diversos gêneros musicais que vão de encontro ao rock, ao samba, a MPB clássica, ao funk e ao indie. Suas letras são simples e nos remetem a observar, de forma mais atenta, ao cotidiano e a vida ao nosso redor.


Seu disco mais recente disco é o recém lançado Mirantes Emocionais. Composto por 11 faixas, o álbum tem produção própria assinada junto ao parceiro de longa data Lucca Noacco e conta com mixagem do veterano produtor carioca Kassin(Los Hermanos, Vanessa da Mata).


Mirantes é fruto de um processo de gravação/composição de três anos nos quais o músico foi de encontro a referências estéticas/sonoras oriundas dos anos 70/80. O trabalho tem, merecidamente, conquistado elogios da crítica nacional e internacional.


Em entrevista, concedida por e-mail, Arthur fala sobre sua formação musical, formatos de gravação (solo e/ou em grupo), a parceria com o produtor Lucca Noacco, o processo de pesquisa, composição e gravação do novo disco, a nova geração de artistas belo-horizontina, a repercussão na crítica internacional de seu novo disco, planos futuros e muito mais. Confira!


PHONO: Sua verve artística vai de encontro a várias sonoridades e isso remete a presunção de que você cresceu num lar musical. Nesse sentido como foi, de fato, os seus anos de formação de musical e quando nasceram as suas primeiras composições?


Minha família e meu pai principalmente sempre foram movidos a música e sempre tocaram música, seja ele em casa ou a família nas rodas de violão e no bloco de carnaval da família na cidade de Jequitinhonha então sempre estive envolto por música de todos os gêneros e estilos desde pequeno. O que me recordo de início foi ouvir Benito di Paula, Bob Dylan, Chico Buarque, Rolling Stones e "Believe" da Cher com meu pai no carro dele e também das marchinhas clássicas no bloco de carnaval. Acho que isso influenciou muito meus primeiros anos de trabalho, lançado músicas que foram criadas muito em cima de samba e bossa nova e, mais recentemente, com esse cuidado em cima das letras e de seus simbolismos. Lembro que minhas primeiras composições surgiram por volta de quando eu tinha uns 13, 14 anos e tinha acabado de aprender o básico do violão. Eram canções bem simples, de três acordes, e a letra sobre amor de um jeito bem simples.


PHONO: Seu disco anterior, Adeus (2020), foi feito durante a pandemia num processo solitário de gravação. Por outro lado, você também já experenciou gravar tendo outros músicos contigo em estúdio. Quais são as semelhanças e desafios de se gravar em ambos os formatos?


O Adeus gravei logo antes da pandemia começar. Então ele foi uma espécie de auto isolamento. Acho que existem prós nos dois formatos de gravação. Sozinho você consegue fazer o que quiser e passa apenas pelo seu filtro de julgamento, sobre o que é válido gravar ou não. O desafio de gravar sozinho é ter que resolver todos os problemas de produção, microfonação, mixagem, escolhas estéticas e tudo mais completamente sozinho, o que pode ser bastante desafiador.


Já com uma banda você tem mais perspectivas e ideias diferentes para tudo que envolve a gravação. Então uma linha de baixo que seria apenas uma ideia de repente existem outras 3 formas diferentes de gravar essa linha de baixo, o que torna a gravação e o processo todo bastante mais criativamente rico. Já o desafio de gravar com um grupo as vezes é chegar a um produto final que todos estejam extremamente satisfeitos, o que pode ser muito difícil lidando com pessoas com referências e objetivos diferentes. Mas creio que toda forma de se fazer música é válida se for feita com o coração, honestidade e por paixão a arte.


PHONO: Mirantes Emocionais tem produção própria junto a Lucca Noacco, parceiro que o acompanha desde o seu primeiro disco. Como se deu a aproximação de vocês e quais as contribuições ele trouxe para o seu trabalho?


Eu e Lucca nos conhecemos através da irmã dele que estudou na minha sala na época de escola. Ele é 3 anos mais velho que eu, então na época de escola nunca chegamos a nos aproximar, mas em 2018 ficamos amigos e ele participou de algumas faixas do disco que lancei naquele ano, o Nhanderuvuçu. Então desde aquela época viramos irmãos e sempre trocamos referências, ideias... E ele também tocou regularmente em quase todos os shows que fiz de 2018 até 2020. Assim com essas novas músicas, escritas em meados de 2021, chamei ele pra produzir o Mirantes Emocionais comigo. O Lucca é uma pessoa extremamente musical e ele tem um ouvido espetacular para adicionar, esteticamente e criativamente, de forma extremamente delicada e precisa nos lugares corretos que realmente precisam de algo. Dá pra ouvir exatamente isso nesse disco, todo o trabalho extremamente atencioso e dedicado dele.


PHONO: Musicalmente, no novo álbum você vai de encontro a sonoridades oriundas das décadas de 70/80, indo do rock ao samba, passando por ritmos latinos e o funk. Então como se deu o processo de pesquisa e construção do novo repertório?


Com esse tempo sozinho na pandemia comecei a ouvir muita coisa que nunca tinha prestado a devida atenção antes, como o pop dos anos 80, a cumbia, o punk e outros…


Acho que de forma inconsciente, enquanto ia compondo e gravando o disco fui ouvindo todas essas novas referências e gêneros. Daí tudo foi se misturando e entrando no disco até que um momento percebi que escrevi algo que nunca teria escrito um ano antes e que precisei ouvir mais referências para saber exatamente onde queria chegar.


A faixa "Princípios Organizadores", foi a primeira que percebi que todas essas novas referências estavam entrando no processo de execução desse disco. E isso também influenciou a forma de abordar o samba e a bossa nova que antes abordava de forma mais inocente e, nesse disco, não quis repetir. Já em faixas como "Zói Fundo", "De Toda Sorte" e "Saídas" essa mistura de novas referências, somado ao que já vinha comigo, se torna evidente.


PHONO: Suas letras remetem ao cotidiano, nos convidando a observar a vida de forma mais atenta. Quais as intenções você alimentou ao adotar essa abordagem?


Creio que foi observando as pequenas coisas do cotidiano e tomando nota delas que, aos poucos, as letras se formaram. O início é sempre mais difícil para faze o sentido de palavras e as ações aleatórias, mas ao desenvolver a melodia as palavras certas vão chegando e a letra se resolvendo. Todos os símbolos e rimas certas também.


Nesse disco tentei usar muito desses simbolismos e não deixar as letras tão na cara como nos meus trabalhos anteriores. Acho que a intenção era de colocar o ouvinte para criar também o seu significado para cada letra de cada música.


PHONO: A capa é uma parceria entre o Davi de Melo dos Santos (artista de rua e grafiteiro) junto a Artur Souza, responsável pelo projeto gráfico. Como se deu a parceria entre vocês e quais as referências estéticas serviram como base para o trabalho final?


O Davi é meu primo, então sempre conversamos sobre ele fazer a capa de um trabalho meu e com essa ideia do Ministério da Consciência [sua atual banda de apoio] veio meio que de forma natural chamar ele. Esse seria o primeiro disco em que eu não fizesse a capa. A ideia era de pegar esse tema dos Mirantes Emocionais, um lugar que você vai para ver suas emoções a distância. Porém não apenas sendo e vivendo elas, mas agir como um observador e colocar essa ideia em formato de desenho. Aí o Davi realizou isso das diferentes faces, com diferentes cores, que representam bem essa ideia e também a parte musical do disco que é repleta de cores, texturas e timbres. Já o Artur Souza fez a capa de todos os singles, a parte gráfica da capa do disco, fotos de divulgação, realizou todos os lyrics vídeos, fez a direção artística e as projeções dos dois shows que fizemos desse disco. O Artur é o diretor artístico deste trabalho e ele colocou outra profundidade extremamente necessária para o disco, que nunca conseguiria pensar sozinho, usando os glitch’s, fitas antigas e outros formatos que remetem muito isso dos anos 70/80.


PHONO: Seu nome é associado a uma nova geração de cantautores belo-horizontinos formada por artistas como Julia Guedes, Haroldo Bontempo, entre tantos outros, que vem, nos últimos anos, ganhando destaque no cenário nacional. Como você vê esse atual momento da cena? E ainda: como é a sua relação com os artistas de sua geração?


Belo Horizonte sempre teve uma cena extremamente produtiva e viva. Lembro em 2017 quando comecei a acompanhar El Toro Fuerte, Moons, Fábio de Carvalho, entre outros, e todos ainda estão aí fazendo música, fazendo shows. Então sempre vi a cena de BH como uma constante para todos os lados. E hoje a Julia e o Haroldo, que é um grande amigo, fazem grandes movimentos na música independente e autoral da cidade. É incrível ver isso acontecer e fazer parte disso. Outro dia estava conversando com o Diego da El Toro sobre isso, sobre essa longevidade, que de uma forma ou de outra, nós temos, e que é difícil de atingir no cenário independente.


PHONO: Mirantes Emocionais tem sido bem recebido pela crítica especializada repercutindo, inclusive, em veículos de imprensa internacionais como a Uncut. Você ficou surpreso com tamanha receptividade?


Com o disco sendo lançado pela Wonderfulsound, eu imaginei que teriam alguns plays em rádios na Inglaterra e em blogs, pelo fato do selo ser de lá e fazer seus movimentos por lá. Mas as reviews da Uncut, Songlines e Backseat Mafia me pegaram de surpresa. É muito bom que ver música independente e autoral consegue atingir o ouvido de pessoas pelo mundo todo e atravessar a barreira da língua. Ainda mais em um mundo hoje no qual o número de plays vale mais do que a própria música muitas vezes e a arte, em alguns campos, fica em segundo lugar. Ainda mais no Brasil onde a cultura de influencers e subcelebridades vazias parecer ter infectado o mundo musica. É extremamente satisfatório ler uma review atenciosa e com palavras construtivas sobre música, arte e nada além disso.


PHONO: Com disco novo para divulgar quais são seus planos futuros?


Por agora é divulgar o disco. Temos um clipe pra sair no dia 7 de Maio. No dia 11 de Julho temos o show de lançamento no Teatro de Bolso do Sesiminas e mais algumas coisas que ainda estão no processo de construção e produção.


Esse é um disco que me vejo trabalhando nele a longo prazo, mas já estamos pensando em mais shows em BH e fora da cidade também junto a outras ações que envolvam o Ministério da Consciência.



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