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Foto do escritorBruno Lisboa

Noite agitada tem BaianaSystem, Francisco, el Hombre e Claudia Manzo

Segundo a Pitty, “nada substitui a experiência de um show ao vivo”. A afirmação não poderia estar mais correta e reitero. Por mais que a música produzida em estúdio cumpra sua função artística que é registrar e documentar o artista e sua visão, é ao vivo que ela, de fato, se materializa.


Performar ante a centenas, milhares de pessoas, com propriedade não é tarefa das mais fáceis. Encontrar caminhos artísticos próprios para levar suas composições aos palcos exige tempo, dedicação e profissionalismo. Há artista porém que, com o passar dos anos, otimizam com louvor essa relação e criam apresentações que transcendem o habitual, resultando em shows provocantes e enérgicos que geram verdadeira catarse coletiva no público.


No vasto cenário da música popular brasileira, artistas como Claudia Manzo, BaianaSystem e Francisco, el Hombre são bons exemplos de propostas cujas trajetórias são marcadas, não só por bons discos de estúdio, mas por produzirem apresentações memoráveis, potencializadas pelo posicionamento político.


Fotos Arena Hall: Flávio Charchar

Outro fator que une os três artistas é o fato de que suas respectivas propostas sonoras primam por uma miscelânea de sons, tendo a música latina como espinha dorsal. Essa estrutura enérgica e identitária fica ainda mais evidente em cima do palco.


Em um fim de semana agitado na capital mineira, quem foi ao Arena Hall, para ver o Baiana ou na Autêntica, para assistir a Francisco, viu como relevantes e potentes as características artistas mencionadas. Para temperar de forma especial os eventos, ambas as apresentações contaram com a presença de Claudia Manzo, cantautora chilena radicada em BH, que vem, nos últimos anos, desenvolvendo um trabalho marcante que merece atenção.


Fotos A Autêntica: Bárbara Moreira

Bruta Flor


Natural do Chile, Claudia Manzo é compositora, instrumentista e professora. Radicada em Belo Horizonte há 10 anos, a artista tem trabalhado com música e teatro, estabelecendo fortes laços com a cena local através de parcerias com artistas como a Orquestra Atípica de Lhamas e a cantora Mariana Cavanellas.


Seu nome ganhou projeção nacional a partir da parceria firmada com o BaianaSystem no disco OXEAXEEXU (2021). No repertório constam duas músicas de sua autoria, "Pachamama" e "Capucha". Desde então, a cantora tem excursionado com a banda pelo país.



Na noite de 5 de agosto, Claudia Manzo desafiou o cronograma da cidade e se desdobrou para fazer duas apresentações em horários justíssimos. A primeira parada foi na Autêntica para a realização de um show em formato solo como atração de abertura para a Franscisco El Hombre. O set, iniciado as 22h, primou por canções que figuram em seus álbuns América por Una Mirada Femenina (2017) e Re-Voltar (2021).


Na sequência, Manzo se dirigiu ao Arena Hall para se apresentar ao lado do BaianaSystem. As canções de sua autoria ao lado do grupo estavam lá, mas a cantautora fez uma participação maior, cantando junto a Russo Passapusso em diversas faixas como "A Mosca", "Bola de Cristal" e "Lucro". Com ares de protagonismo, a cantora chilena fez de sua participação um manifesto feminista. Sua fala foi pontual, emocionada e direcionada contra a barbárie de um caso de estupro ocorrido em BH na última semana.



Sulamericano


Com produção da Malab, o show realizado no Arena Hall foi uma rara oportunidade de assistir ao BaianaSystem em formato solo já que as últimas passagens do grupo pela cidade ocorreram em festivais, geralmente, fechando o lineup.


Musicalmente, o Baiana aposta num diálogo entre o sound system jamaicano, a guitarra baiana e o improviso. Com a chancela de uma das melhores bandas da atualidade, o show no Arena hall contou com os graves de SekoBass, as guitarras suingadas e pesadas de Beto Barreto e Juninho Costa, a cozinha percussiva de Icaro Sá, as teclas de Maestro Ubiratan Marques, os beats eletrônicos de João Meireles e o carisma de Russo Passapusso e Claudia.





Para além do caráter musical, vale ressaltar o caráter visual das apresentações da banda. Com direção de Filipe Cartaxo, as intervenções gráficas são um espetáculo a parte. Desde os primeiros acordes de "Reza Forte", que abriu o set de quase duas horas, o público se mostrou entregue à banda, dançando e abrindo enormes rodas que fizeram parte da apresentação do início ao fim. Faixas como "Cabeça de Papel", "Duas Cidades", "Playsom" e "Saci" foram alguns dos pontos altos da noite.


Chama Adrenalina


Por sua vez, a Francisco, el Hombre une rock, pop, folk e ranchera (gênero tradicional mexicano) que resultaram numa sonoridade ímpar no cenário nacional. A simbiose promovida pelos irmãos Sebastián e Mateo Piracés-Ugarte, mais Juliana Strassacapa, Andrei Martinez Kozyreff e Helena Papini mostram como, ao longo de 10 anos de carreira, a banda amadureceu musicalmente e como isso se materializou nas performances ao vivo.



Em clima de celebração, o set primou por resgatar faixas presentes nos três discos de estúdio que ganharam versões estendidas que promoveram interações ainda maiores com o público. De Soltasbruxa (primeiro e mais celebrado disco do grupo) vieram faixas como "Tá com Dólar, Tá com Deus", "Calor da Rua","Sincero" e o hino indispensável "Triste, Louca ou Má". Do trabalho seguinte, Rasgacabeza (2019), a banda tocou "CHAMA ADRENALINA: Gasolina", "CHÃO TETO PAREDE: Pegando Fogo" e "O TEMPO É SUA MORADA: Celebrar". Já do disco mais recente, Casa Francisco (2021), canções como "Arrasta" e "Nada Conterá a Primavera" fizeram a cabeça de quem compareceu na Autêntica.


Cumprindo a promessa anunciada em redes sociais, a Francisco colocou todo mundo para suar, em mais uma apresentação quente e memorável para o público mineiro.




Marco Temporal, não!


A carga política, habitual para ambas as bandas, também se fez presente em suas respectivas apresentações com claras manifestações contra o Marco Temporal, projeto de lei que será votado pelo Senado Federal nos próximos dias e que ameaça mudar radicalmente o critério para demarcações das terras indígenas. Com isso, um grupo indígena que tenha ocupado um território por séculos, mas que, por alguma ocasião, não estivesse no local na data exata estabelecida pelo marco temporal, pode ficar sem direito às suas terras.



Conclusão


Claudia Manzo, BaianaSystem e Francisco, el Hombre são bons exemplos do que de melhor a música produzida em terras brasileiras tem a oferecer. A versatilidade sonora e as performances eletrizantes conquistaram o público que compareceu aos shows, assim como o engajamento político que gera empatia, reflexão e soam como convites legítimos à participação na defesa por direitos sociais essenciais. Afinal, música também é política.



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